Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga. Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga.
Foto: Beto Skeff
Foto: Beto Skeff

Sertão Ficção – Fantasias e Futuros debate as dificuldades de produzir o “futurismo nordestino”

Neste domingo, dia 13, aconteceu o encerramento da XV Bienal Internacional do Livro do Ceará, maior evento cultural do estado e palco de exibição de inúmeras manifestações artísticas. O décimo e último dia de um evento assim, naturalmente, convida olhar para a frente e a fazer perguntas sobre o futuro. Dessa forma, não há momento melhor para o bate-papo “Sertão Ficção – Fantasias e Futuros”, com os autores e artistas Zé Wellington, Shiko, e Izma Xavier, todos imersos na idealização e produção de obras de ficção científica e fantasia, mas com características nordestinas.

Shiko é um premiado quadrinista paraibano, cujas obras misturam ambientações no interior nordestino com influências de faroestes e distopias estrangeiras. Apesar de se tornar um assíduo leitor por meio da literatura de cordel, o autor relatou que inicialmente, tinha uma certa dúvida sobre como abordar o Nordeste em sua arte. “Ao mesmo tempo que eu tinha uma relação com essa leitura da tradição sertaneja, eu descobri a banca de revistas. Os animes lá do Akira, o quadrinho europeu, o gibi do Conan, meu mundo sempre foi esse também. Eu tenho muita ressalva com o discurso que a cultura sertaneja se resume à tradição. A partir do momento que eu entrei numa banca de revista, meu mundo foi aquilo ali também, sempre tinha um pé em cada parte. E eu tenho muito cuidado de cair na armadilha fácil de ter sempre que provar minha sertanice. Quero desenhar um nordestino fora do folclórico, do engraçado, do esteriotipado.”

Com essa influência de fantasias e ficções científicas criadas de fora do Nordeste, os membros da banca foram levados a pensar sobre como mesclar suas influências de forma não-esteriotipada. A solução que os três encontraram, independentemente uns dos outros, foi no que eles descrevem como “gambiarra”. Izma, compositora, artista visual e escritora sobralense, diz: “Tem umas coisas que eu olho e fico ‘que horas que o futuro do nosso Nordeste vai chegar nesse lugar de robôs, de corpos perfeitos?’ Parece que nunca. Isso sai do lugar da gambiarra, que se parece muito mais com o que a gente tem de real, próximo da gente, tecnológico, que é a forma que a gente dá um jeito de fazer as coisas”.

Izma citou um filme chamado “Quimanga, comendo como os povos do mar”, um documentário sobre a cultura alimentar de uma comunidade na costa do Ceará. “A narrativa fica entre a vida da galera que pesca na praia e como o celular, o carro, a moto, a internet, as tecnologias que a gente tem, facilitam esse trabalho. Não é o futurismo de uma máquina que entra no mar pra pescar, mas existe essa ferramenta que é um novo órgão, existe uma vivência nesse outro lugar que é a internet. E pra mim esse é um ótimo exemplo do que pode ser a ficção científica cearense, o futurismo nordestino.”

Essas influências encontradas em obras diversas, e esse “jeito que a gente dá de fazer as coisas”, não são apenas fatores motivantes das temáticas das obras, mas sim das próprias produções. Wellington, autor e roteirista sobralense do quadrinho Cangaço Overdrive, explicou: “Eu comecei a fazer fanzine de banda, depois que eu fui fazer fanzine de quadrinhos. E a gente que trabalha com quadrinhos, vive dessa dinâmica do evento. De montar banquinha, de vender coisas, de fazer um circuito de viajar pelo Brasil, que é massa, mas é muito cansativo, muito complicado, ainda mais quando você vive aqui na asa Norte do Brasil.”

A conjuntura é complexa para os artistas nordestinos de ficção e fantasia, que bebem da cultura de fora, mas estão distantes dos centros de onde tal cultura se origina. Mas isso não os desmotiva. Nas palavras de Izma, “você não vai deixar de fazer um filme porque você não tem uma câmera perfeita, não vai deixar de escrever porque não tem editora, não vai deixar de compor porque não tem instrumento. A gente vai dando um jeito, né? A quantidade de artistas musicais que eu conheço, que conseguiu lançar alguma coisa, em parte porque usa o mesmo programa, que é pago, que todo mundo pirateia de alguma forma pra poder dar certo, vira uma rede meio que de apoio. A gambiarra sozinha não serve pra nada, se a gente não passar pra frente o que está aprendendo, o que está descobrindo, pra todo mundo poder fazer o que quer fazer.”

A Bienal Internacional do Livro do Ceará é uma realização do Ministério da Cultura (MinC) e do Governo do Ceará, por meio da Secretaria da Cultura (Secult), em parceria com o Instituto Dragão do Mar (IDM), via Lei Rouanet de Incentivo à Cultura. O evento conta com o patrocínio do Banco do Nordeste, Rede Itaú, Cagece e Cegás.

Serviço:

Bienal Internacional do Livro do Ceará 
Quando: 4 a 13 de abril, das 9h às 22h
Onde: Centro de Eventos do Ceará – Avenida Washington Soares
Gratuito e aberto ao público
Programação no site: https://bienaldolivro.cultura.ce.gov.br 

Compartilhe

Barra de acessibilidade