Em 30 de Abril de 1825, no atual Passeio Público de Fortaleza, foi executado a tiros de arcabuz o Padre Mororó, um dos principais expoentes da Confederação do Equador, movimento nordestino, revolucionário, republicano e constitucionalista contra o Império de Dom Pedro 1º. A Confederação foi um dos movimentos revolucionários mais violentamente punidos da história do Império brasileiro, com 31 participantes espalhados do Nordeste sendo condenados à morte. Nesta XV Bienal Internacional do Livro do Ceará, este sábado, dia 12, a meros 18 dias do bicentenário da morte de Padre Mororó, foi lançado o livro “Sertão Confederado”, do premiado poeta e dramaturgo Mailson Furtado, sobre a história da Confederação em terras cearenses.
A ideia de Sertão Confederado não surgiu com Mailson, mas sim com Liduíno Brito, diretor-geral da Fundação Sintaf. “Em 2017, nós [a Fundação] estivemos no Crato no relançamento de um dos melhores livros escritos no estado do Ceará, “O Império do Bacamarte”, que conta a história do Cariri do tempo dos coroneis. E lá, a gente conversou sobre o coronelismo, e evidenciaram a questão da Independência do Brasil, a independência do Ceará. E aí eu fiquei “vou aguardar que façam algum trabalho sobre”. 2017, 200 anos da Revolução do Crato, nada. 22, a Independência do Brasil, praticamente nada. Aí pensei “não, eu vou fazer alguma coisa pro bicentenário da Confederação do Equador.” Chamei Mailson lá na Fundação. Eu queria que a gente fizesse uma peça que relatasse essa história da Confederação do Equador, e que a gente não siga a história tradicional. A história do Ceará precisa ser reescrita. A juventude hoje precisa saber quem foram nossos herois, as pessoas que defenderam esse espaço e deram um certo sentido a todo o Nordeste”.
E Mailson cumpriu com louvor a missão de resgatar esses herois, dando destaque a alguns dos mais esquecidos entre eles. Antes de ser publicado como livro, Sertão Confederado foi uma peça com mais de vinte personagens, mas com dois que podem ser chamados de principais: o casal Tristão Gonçalves de Alencar Araripe, interpretado pelo próprio Mailson, e sua esposa Ana Triste, interpretada por Yane Cordeiro. Mesmo entre os poucos prestigiados personagens cearenses da Confederação do Equador, Tristão e Ana são particularmente esquecidos, sem ao menos retratos ou outros registros de sua fisionomia tendo sobrevivido ao tempo. Tristão era filho de Bárbara de Alencar (a primeira presa política da história do Brasil por seu papel na Revolução do Crato), e foi o governador do Ceará republicano durante a confederação, tendo adicionado a seu nome o sobrenome Araripe em homenagem a Chapada. Ana nasceu Ana Porcina Ferreira de Lima, mas mudou seu nome para Ana Triste de Alencar Araripe depois da morte de Tristão, emboscado por forças imperiais às margens do Rio Jaguaribe em 31 de outubro de 1824.
Ana é a narradora de Sertão Confederado, mas de forma fisicamente separada, sentada em um móvel de madeira com papel e pena na mão, como se os eventos que se decorrem na história estejam sendo recontados pela viúva depois do tempo. É uma forma de centralizar uma personagem da qual poucos registros históricos sobrevivem, mas cuja história não é menos importante que a dos mártires masculinos eternizados nas ruas de Fortaleza, como Tristão Gonçalves, Padre Mororó, Pessoa Anta, entre outros.
A transformação da peça em livro, então, é um segundo movimento na missão de fixar os confederados na memória. Com o relato da sua experiência no Sertão, Yone aponta que “as pessoas quando assistem, dizem ‘ah, queria tanto que todo mundo visse, que fosse pras escolas’, porque de fato é um espetáculo que precisa chegar sobretudo na juventude, precisa chegar nas pessoas, pra que se abram também esses olhares sobre a história do nosso estado, sobre essa cearensidade que a gente precisa conhecer, e se apropriar. E quando a gente transforma o espetáculo em livro, é mais um caminho que se abre pra que esse trabalho, esse texto, se perpetue e possa ser depois remontado por outras companhias de teatro, e chegar nas pessoas também pelo meio da leitura.”
A Bienal Internacional do Livro do Ceará é uma realização do Ministério da Cultura (MinC) e do Governo do Ceará, por meio da Secretaria da Cultura (Secult), em parceria com o Instituto Dragão do Mar (IDM), via Lei Rouanet de Incentivo à Cultura. O evento conta com o patrocínio do Banco do Nordeste, Rede Itaú, Cagece e Cegás.
Serviço:
Bienal Internacional do Livro do Ceará
Quando: 4 a 13 de abril, das 9h às 22h
Onde: Centro de Eventos do Ceará – Avenida Washington Soares
Gratuito e aberto ao público
Programação no site: https://bienaldolivro.cultura.ce.gov.br